Irrecusável. Ele surgira com a calma que a idade permite, longe da fogosidade jovem, e lançara o desafio: - Uma viagem de veleiro! Só os dois, sem filhos, nem netos, nem amigos, nem telemóveis. Eles e o mar, descobrindo cada amanhecer, vendo chegar a noite com uma taça de champanhe. Está bem, para ti eu preparo um Kir Royal, concedera até.
Quando a vida dá muitas voltas, quando a existência se escreve de muitas exigências, afastamentos, saudades e promessas adiadas, a idade, se estivermos atentos, oferece uma oportunidade. Aceitas? E ela, que sempre temera o mar, as ondas, a navegação, concordara sem dar por isso. Os dois tinham tudo preparado, ela insistiu nos últimos telefonemas às filhas - sempre a ansiedade materna - e partiram. Foram as férias ousadas, diferentes, cheias de silêncios feitos de mil dizeres e sentires. O veleiro alugado, moderno e simples, permitia-lhes a cumplicidade das tarefas a partilhar. As noites, como ele prometera, faziam-se de ternura reinventada, de partilha real e efectiva, e cada nascer de sol trazia-lhes a certeza de que a vida se renova e a felicidade é possível ainda que. Sempre que.
À chegada, os dois renovados, caminharam pela praia e ela, rindo como julgava já nem saber rir, comentara que aquelas cascas pisadas podiam, perfeitamente, ser a metáfora de um passado que ficara definitivamente desfeito!